terça-feira, 12 de outubro de 2010

Análise Narrativa 2.2

Sequência Narrativa

Lc 10: 21-37


Importa saber que uma sequência narrativa caracteriza-se por unir entre si um conjunto de micro-relatos debaixo de um tema comum e/ou de uma personagem principal. Assim temos sequências temáticas e sequências com base no personagem principal ou ambas. O enquadramento espacio-temporal é também um precioso indicador de uma sequência narrativa.
Assim relativamente ao conjunto e ao número de micro-relatos que compõem esta sequência temos um conjunto de três micro-relatos, a saber:

21-22:

21Nesse mesmo instante, Jesus estremeceu de alegria sob a acção do Espírito Santo e disse: «Bendigo-te, ó Pai, Senhor do Céu e da Terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e aos inteligentes e as revelaste aos pequeninos. Sim, Pai, porque assim foi do teu agrado. 22Tudo me foi entregue por meu Pai; e ninguém conhece quem é o Filho senão o Pai, nem quem é o Pai senão o Filho e aquele a quem o Filho houver por bem revelar-lho.

23-28:

23Voltando-se, depois, para os discípulos, disse-lhes em particular: «Felizes os olhos que vêem o que estais a ver. 24Porque - digo-vos - muitos profetas e reis quiseram ver o que vedes e não o viram, ouvir o que ouvis e não o ouviram!». 25Levantou-se, então, um doutor da Lei e perguntou-lhe, para o experimentar: «Mestre, que hei-de fazer para possuir a vida eterna?» 26Disse-lhe Jesus: «Que está escrito na Lei? Como lês?». 27O outro respondeu: «Amarás ao Senhor, teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma, com todas as tuas forças e com todo o teu entendimento, e ao teu próximo como a ti mesmo.» 28Disse-lhe Jesus: «Respondeste bem; faz isso e viverás.


29-37:

29Mas ele, querendo justificar a pergunta feita, disse a Jesus: «E quem é o meu próximo?» 30Tomando a palavra, Jesus respondeu: «Certo homem descia de Jerusalém para Jericó e caiu nas mãos dos salteadores que, depois de o despojarem e encherem de pancadas, o abandonaram, deixando-o meio morto. 31Por coincidência, descia por aquele caminho um sacerdote que, ao vê-lo, passou ao largo. 32Do mesmo modo, também um levita passou por aquele lugar e, ao vê-lo, passou adiante. 33Mas um samaritano, que ia de viagem, chegou ao pé dele e, vendo-o, encheu-se de compaixão. 34Aproximou-se, ligou-lhe as feridas, deitando nelas azeite e vinho, colocou-o sobre a sua própria montada, levou-o para uma estalagem e cuidou dele. 35No dia seguinte, tirando dois denários, deu-os ao estalajadeiro, dizendo: ‘Trata bem dele e, o que gastares a mais, pagar-to-ei quando voltar.’ 36Qual destes três te parece ter sido o próximo daquele homem que caiu nas mãos dos salteadores?» 37Respondeu: «O que usou de misericórdia para com ele.» Jesus retorquiu: «Vai e faz tu também o mesmo.

O tema desta sequência diz respeito à revelação em Jesus, como ilustra o primeiro relato, de Deus que é amor e misericórdia como ilustram o segundo relato e o terceiro no qual Jesus conta a parábola do bom samaritano. Sendo uma intriga de revelação, como fica expresso no versículo 22, Jesus é o centro da sequência, ou seja, é claramente a personagem principal que estremecendo de alegria (v.21) se dirige em oração ao Pai após a qual dirige uma palavra aos discípulos. Sendo experimentado por um doutor da Lei sobre as condições para se ter a vida eterna, Jesus interroga-o sobre o fundamento da Lei para no fim lhe propor uma parábola sobre o amor de Deus e o amor do próximo. Jesus é uma personagem redonda manifestamente. O seu ensinamento brota da sua oração, da sua intimidade com o Pai. Intimidade única que faz d’Ele o único que pode revelar o Pai.
No enquadramento desta sequência não qualquer referência explícita ao espaço. Há apenas uma referência ao tempo: naquela mesma hora (original grego), e não instante como está na presente tradução. Esta referência poderia ser uma referência ao tempo mortal/cronológico ou a um tempo simbólico, ou seja, um tempo kairológico, pois esta hora como a hora da revelação de Jesus. É provavelmente ao tempo kairológico que se refere a expressão naquela mesma hora, enquanto esta hora é uma hora epifânica, da manifestação, sob acção do Espírito Santo, de Jesus, o Filho, como o revelador e revelação do Pai. Esta hora porque simbólica, hora epifânica, engloba toda a sequência (início e fim), ainda que haja em cada micro-relato modos diferentes de contar o tempo. Assim nos dois primeiros (vv.21-22; 23-28) micro-relatos temos duas cenas, pois o tempo do relato e o tempo da história são iguais. No último (vv.29-37) temos um sumário, uma vez que o tempo do relato é mais breve que o tempo da história. Esta sequência inicia-se com a oração que Jesus dirige-se ao Pai (v.21) e termina com o mandato de Jesus vai e faz o mesmo (v.37).

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