Como Mateus viu Rute?
Parece que Mateus entendeu que as autoras ou autores desse texto também esperavam o Messias, mas com sua ótica. Em vez dos reis opressores e exploradores (M1,6-11), no lugar de figuras ilustres (Mt 1,12-15), o novo Davi será descendente de Obede, portanto, será um Messias que serve. O novo Davi será descendente não só de homem, mas também de mulher: um desafio (ou um desrespeito) à jurisprudência judaica. Está a nossa comunidade mateana “jogando pesado” contra os tempos e os projetos de Esdras que chegaram até Jesus? Não serão os da linha de Esdras, as pessoas da lei discricionária, quem se oporão e até matarão Jesus? Rute vem do mundo estrangeiro. Ela era viúva e viveu, fortemente, a experiência dos pobres. Mateus deve ter olhado com muito carinho a história de Boás no livro de Rute, deve ter se empolgado com sua abertura para com a mulher estrangeira e, possivelmente, deve ter se impressionado com a determinação pela vida desta mulher e a fidelidade a quem não tinha teto, ficara sem família e não tinha pão para se alimentar. Deve ter pensado: como vou homenagear Noemi e os resistentes? Não teve dúvida: “Boás gerou Obede, de Rute” (Mt 5,b). Não tem nada da mentalidade de Jerusalém, do Templo e seu culto, da idéia de Zorobabel (que também entra na genealogia: Mt1,12c). Muito menos, da lei da “pureza” da raça de Esdras. Se Esdras havia expulsado as mulheres estrangeiras com seus filhos (Esd 10,30; Rt 1,1), Mateus entendeu que os pobres (Noemi) as traziam de volta. Assim como Esdras, Herodes (Mt 2,13-15) também não faz
os pobres fugirem para o estrangeiro (Egito)? Não é, por acaso, que o Evangelho de Mateus terá uma carga interessante de abertura aos estrangeiros, do início ao fim. Além da genealogia (Mt 1,1-17), logo, após o nascimento do menino, a comunidade mateana “brinda” o mundo “das nações”, com o relato universal do Evangelho: a vinda dos magos do Oriente a Belém (Mt 2,1-12). Se a comunidade mateana era formada, fortemente por judeus convertidos e escreve para outros judeus, é muito importante perceber, como os redatores finais não têm nada do “espírito de Esdras” que estava forte em alguns partidos do tempo de Jesus. É muita abertura para as
nações. O Jesus de Mateus lembra muito um outro homem de Belém, o Boás do livro de Rute. Vejamos: uma perícope importante é a do centurião romano que, segundo Jesus, tinha “mais fé” do que os seus conterrâneos israelitas (Mt 8,5-13) e ali, Jesus, numa compreensão genial, afirmou que “virão muitos do oriente e do ocidente e se assentarão à mesa no reino dos céus, com Abraão, Isaac e Jacó...” (Mt 8,11). Portanto, ele abre a porta da salvação a todas as nações. Em Mt 12,18, a comunidade mateana atualiza uma perícope de Isaias (Is 42,1-4) na pessoa de Jesus que “anuncia o Direito às nações ... e no seu nome as nações porão sua esperança”. Já na alegoria de Mt 21,33-46, anunciando a vinha e a historia da aliança, é dito que o Senhor partiu para o estrangeiro. Na alegoria das bodas em Mt 22,1-14, todos são convidados, porém, os convocados das encruzilhadas são os pecadores e os pagãos, sendo que, ao final, mostra a força da “justiça” ligada à fé. O grande julgamento (Mt25,31-46) é para todas as nações (v.32). E, no final do Evangelho (Mt 28,16-20), mostra a missão universal, ou seja, para todas as nações (Mt 28,19). Possivelmente, o grupo ligado à mentalidade de Esdras não gostaria de escutar estes anúncios, para além do universo israelita. Se Esdras “bateu firme” na observância da lei, Mateus compreenderá a força do livro de Rute com uma outra lei: a do “resgate” e do “levirato” (as duas leis se tornam uma só). Assim, propõe a mentalidade de que se devem salvar a posse da “terra” aos pobres bem como a “família” no sentido mais amplo, para que também os pobres tenham pão. A Lei compreendida pela comunidade mateana é baseada, sempre, na “justiça”. Os cinco Sermões de Mateus, especialmente o primeiro (Sermão da Montanha: Mt 5-7) é um tratado vivo do que é a nova “Justiça” (FERREIRA, 1978, p. 9-31). O Sermão do Montanha é Evangelho. Os discípulos de Jesus conseguirão vivê-lo, ultrapassando a “falsa justiça” dos doutores da lei e fariseus, porque os seguidores de Jesus, nesta mentalidade da nova justiça, têm os corações pobres e livres. A nova justiça é uma raiz contra toda auto-suficiência. Outro detalhe importante no Evangelho de Mateus é que parece que ele, ao fazer a redação final, tinha o livreto de Rute de lado. Dá-nos a impressão, que ele via Noemi e seu marido, os dois filhos (portanto, os três com morte prematura) e, também, Rute. A persistência dessa comunidade deve ter levado Mateus a compreender melhor Jesus e sua opção pelos pobres. Todo o livro mateano tem esta clareza. Num momento (Mt 11,25-27), há a exaltação dos pequeninos. Os pequenos do tempo de Esdras e sua resistência lembravam, provavelmente, os pequenos do tempo de Jesus massacrados pelo Império Romano e a força de Jerusalém e do Templo. O Pai se revelou, não aos sábios e doutores, porém, aos pequeninos. Assim foi do agrado do Pai.
os pobres fugirem para o estrangeiro (Egito)? Não é, por acaso, que o Evangelho de Mateus terá uma carga interessante de abertura aos estrangeiros, do início ao fim. Além da genealogia (Mt 1,1-17), logo, após o nascimento do menino, a comunidade mateana “brinda” o mundo “das nações”, com o relato universal do Evangelho: a vinda dos magos do Oriente a Belém (Mt 2,1-12). Se a comunidade mateana era formada, fortemente por judeus convertidos e escreve para outros judeus, é muito importante perceber, como os redatores finais não têm nada do “espírito de Esdras” que estava forte em alguns partidos do tempo de Jesus. É muita abertura para as
nações. O Jesus de Mateus lembra muito um outro homem de Belém, o Boás do livro de Rute. Vejamos: uma perícope importante é a do centurião romano que, segundo Jesus, tinha “mais fé” do que os seus conterrâneos israelitas (Mt 8,5-13) e ali, Jesus, numa compreensão genial, afirmou que “virão muitos do oriente e do ocidente e se assentarão à mesa no reino dos céus, com Abraão, Isaac e Jacó...” (Mt 8,11). Portanto, ele abre a porta da salvação a todas as nações. Em Mt 12,18, a comunidade mateana atualiza uma perícope de Isaias (Is 42,1-4) na pessoa de Jesus que “anuncia o Direito às nações ... e no seu nome as nações porão sua esperança”. Já na alegoria de Mt 21,33-46, anunciando a vinha e a historia da aliança, é dito que o Senhor partiu para o estrangeiro. Na alegoria das bodas em Mt 22,1-14, todos são convidados, porém, os convocados das encruzilhadas são os pecadores e os pagãos, sendo que, ao final, mostra a força da “justiça” ligada à fé. O grande julgamento (Mt25,31-46) é para todas as nações (v.32). E, no final do Evangelho (Mt 28,16-20), mostra a missão universal, ou seja, para todas as nações (Mt 28,19). Possivelmente, o grupo ligado à mentalidade de Esdras não gostaria de escutar estes anúncios, para além do universo israelita. Se Esdras “bateu firme” na observância da lei, Mateus compreenderá a força do livro de Rute com uma outra lei: a do “resgate” e do “levirato” (as duas leis se tornam uma só). Assim, propõe a mentalidade de que se devem salvar a posse da “terra” aos pobres bem como a “família” no sentido mais amplo, para que também os pobres tenham pão. A Lei compreendida pela comunidade mateana é baseada, sempre, na “justiça”. Os cinco Sermões de Mateus, especialmente o primeiro (Sermão da Montanha: Mt 5-7) é um tratado vivo do que é a nova “Justiça” (FERREIRA, 1978, p. 9-31). O Sermão do Montanha é Evangelho. Os discípulos de Jesus conseguirão vivê-lo, ultrapassando a “falsa justiça” dos doutores da lei e fariseus, porque os seguidores de Jesus, nesta mentalidade da nova justiça, têm os corações pobres e livres. A nova justiça é uma raiz contra toda auto-suficiência. Outro detalhe importante no Evangelho de Mateus é que parece que ele, ao fazer a redação final, tinha o livreto de Rute de lado. Dá-nos a impressão, que ele via Noemi e seu marido, os dois filhos (portanto, os três com morte prematura) e, também, Rute. A persistência dessa comunidade deve ter levado Mateus a compreender melhor Jesus e sua opção pelos pobres. Todo o livro mateano tem esta clareza. Num momento (Mt 11,25-27), há a exaltação dos pequeninos. Os pequenos do tempo de Esdras e sua resistência lembravam, provavelmente, os pequenos do tempo de Jesus massacrados pelo Império Romano e a força de Jerusalém e do Templo. O Pai se revelou, não aos sábios e doutores, porém, aos pequeninos. Assim foi do agrado do Pai.
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