terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Diferências significativas entre os Sinópticos
Marcos
Para este poste, tenho como referência os apontamentos das aulas, apresentando de forma geral o que caracteriza cada evangelho.
Começamos em primeiro lugar, pelo evangelho de Marcos. É caracterizado, logo no princípio, pela afirmação cristológica: “Princípio do Evangelho de Jesus Cristo, filho de Deus” (Mc 1,1). É a máxima confissão de fé, em que Jesus, o Cristo, aparece como o Messias esperado. Mas quando passamos do título ao evangelho, não encontramos esta cristologia maximalista, mas pelo contrário é como se Mc fizesse um trabalho de “detective” através de imagens, lembranças, etc., para que, chegando ao final, se confirme o que foi dito no princípio. Isso para que tenhamos a alegria de um Jesus que vai sendo descoberto progressivamente. Ou seja, procura-se um arké, um princípio, a partir do qual vai-se contar a história de Jesus do ponto de vista de um discípulo.
Quanto ao género literário, Mc apresenta a novidade, porque “inventou” um género literário que é híbrido, e que abrange todas as formas clássicas com que se catalogava um evangelho (no mundo clássico: biografia, mas a história é contada não a partir de um herói, mas a partir duma pessoa qualquer; narrativa com traços de tragédia; novelas populares, não no sentido de fazer uma sátira da história, pois que nos evangelhos há sempre uma reflexão, revelação da mesma; a retórica. No mundo judaico: Apocalipse; parábola; homilia ou midrash).
No género literário é importante o Narrador. O narrador em Mc é extra-diagético (fora da narrativa, fala em terceira pessoa) mas ao mesmo tempo é omnisciente (explica o que se está a passar); mantém uma relação de confiança com o leitor. A confiança que o leitor tem do narrador vai ser fundamental para que o leitor acredite nesta história e saiba que diz a verdade sobre uma grande coisa: o escândalo do Messias crucificado. O leitor chega ao fim do capítulo 16 de Mc e deve dizer alguma coisa: afinal este Jesus é ou não é o Messias?. É chamado então a tomar uma decisão.
Outras marcas interessantes em Mc dizem respeito à economia do discurso narrativo: diz-se pouco mas com uma força descritiva muito grande, com uma intensidade muito própria. A linguagem é simples e comum, o grego que ele usa é chamado grego Koine: grego que servia às relações comerciais, grego falado e não literário, e portanto muito prático. Isso conspira para dar-nos a ver o essencial sobre Jesus. Mas nesta sobriedade (poucas palavras, imagens, etc.) há uma força descritiva quase pictórica: evangelho muito visível. Basta uma palavra ou alusão e vê-se a cena. Umas das etiquetas de Mc confrontado com os outros são as lacunas (exemplo: não tem o evangelho da infância; o relato das aparições do Ressuscitado, etc.), com as quais procura-se atiçar a imaginação do leitor, convocando-o a dar a sua colaboração.
Mas o que mais caracteriza Mc em relação aos outros Sinópticos é o capítulo 4, chamado a “secção das parábolas”. Mc é o pior autor para fala de parábolas. Alguns dizem que ele é apenas um comparador, faz comparação baseando-se nas parábolas mais ricas de Mt e Lc. Jesus em Mc, desde o princípio do evangelho é perseguido, logo tem que falar em código (parábolas). Estão aqui concentrados alguns temas fundamentais do evangelho de Mc:
- Ensinamento de Jesus: Jesus é alguém que ensina, que tem uma proposta de sabedoria. Em Mc uma das imagens fortes que aparece é Jesus como Mestre.
- Questão do reino de Deus: encontra-se desde já no inicio da pregação de Jesus (Mc 1, 14-15); a substância do evangelho de Deus que Jesus anuncia é o reino. Mas no cap. 4 conhece uma especificação, determinação relevante com as parábolas do Reino.
- Revelação – escondimento: campo semântico importante em Mc, que vive nesta dualidade. É aqui que aparece pela única vem em Mc a palavra “mistério”: realidade subentendida, presente mas ao mesmo tempo oculta.
- Papel dos discípulos: há uma ambiguidade. Por um lado torna-os interlocutores privilegiados de Jesus aos quais lhes explica tudo em privado; mas ao mesmo tempo lhes acusa de cegueira e de falta de fé. Mesmo com as explicações das parábolas, eles não as entendem.
- Apocalíptica judaica e cristã. A mecânica é esta: é mostrada através da visão alguma coisa a um vidente. Este porém é incapaz de compreender e isso lhe vai ser dado por Deus. No capítulo 4 de Mc encontramos dois movimentos antitéticos: Jesus quer fazer-se entender (Mc 4,1); ele ensinava, usava comparações, tinha uma palavra inteligível que era captada e suscitava admiração nos ouvintes. Quando os discípulos não o entendem, Jesus admirava-se profundamente, porque é claro que ele procurava ser entendido. Mas ao mesmo tempo há um processo de diferenciação e ocultamento: há coisas que Jesus ensina somente aos discípulos e não a todos; ocultação: a verdade está presente mas de forma oculta e que portanto precisa de explicação. Há uma cegueira, caracterizada pela citação do profeta Isaías (6,9-10). Mc denuncia-a: é a incapacidade de compreender porque há uma falta da chave para fazê-lo, que só será manifestada na Cruz (chave hermenêutica).
Por fim, o final do evangelho de Marcos (16,1-8) é enigmático, porque é abrupto: aparição do Anjo às mulheres, às quais convida a anunciar aos discípulos que Cristo tinha ressuscitado dos mortos; elas porém tiveram medo e não disseram nada a ninguém. O primeiro reflexo foi então juntá-lo ao final longo, para se assemelhar aos outros evangelhos, mas que não é autentico, e que portanto não foi escrito por Mc.
Em seguida, colocarei os postes dos outros Evangelhos, o de Mateus e Lucas.

Sem comentários:

Enviar um comentário