quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Análise da História e Discurso no relato da “Ressurreição da filha de Jairo” dos Evangelhos Sinópticos

Mt 9, 18-19 - 23-26
Mc 5, 21-24 – 35-43
Lc 8, 40-42 – 49-56

Os três Evangelhos Sinópticos contam a história da “Ressurreição da filha de Jairo”. Falam-nos de um “chefe”, que Marcos e Lucas dizem ser da sinagoga, que prostrado aos pés de Jesus lhe implora pela cura da filha. Jesus dirige-se a casa dele e encontrando um grande “alarido” pela morte da menina, repreende os presentes, dizendo-lhes que ela não estava morta mas simplesmente a dormir. Fora dos olhares da multidão, Jesus toma a mão da menina e esta ergue-se.

Se no essencial é esta a história narrada, já quanto ao discurso, ou seja, ao modo como a história é contada, existem grandes variações entre os três Evangelhos. Essas diferenças são muito evidentes sobretudo entre o relato de Mateus e os relatos de Marcos e Lucas. Contudo, mesmo entre os dois últimos podemos encontrar variantes no modo como a história é contada.
Mateus não se detém no que não é essencial para relatar o milagre realizado por Jesus, descrevendo a cena com grande economia de meios: interessa-lhe contar a vida de Jesus e, como tal, pôr em evidência o poder e a autoridade do Cristo. Por isso não nos indica qual o nome do pai da criança e diz-nos apenas que era um “chefe”. Na cena dentro da casa, o Evangelista é também parco de informações, não deixando contudo de referir que no seu interior estavam “flautistas” e uma multidão em grande alarido, descrição aparentemente secundária, mas fundamental para vincar a factualidade da morte física da menina e assim evidenciar ainda mais o carácter sobrenatural da acção de Jesus.

Em Marcos e Lucas o objectivo é também dar-nos a conhecer Jesus e pôr em evidência o poder e a autoridade do Cristo. Contudo, fazem-no com matizes diferentes, com uma narrativa muito mais desenvolvida, mais descritiva, repleta de pormenores, como que transformando o leitor em testemunha da própria cena: «Jesus foi recebido pela multidão»; «ao vê-lo, prostrou-se a seus pés e suplicou instantemente»; «Ainda Ele estava a falar».

Introduzem neste relato também a temática do discipulado e da fé, que é condição para se ser discípulo e para ser contado entre os seus “eleitos”, os que entram no interior da casa: «E não deixou que ninguém o acompanhasse, a não ser Pedro, Tiago e João, irmão de Tiago», ou «Não tenhas receio; crê somente e ela será salva.»

Ambos sublinham o carácter extraordinário da acção de Jesus, referindo o «assombro» e o espanto dos que tomaram conhecimento do sucedido.
Marcos, um pouco mais sucinto do que Lucas, mas grande mestre na arte de contar, introduz um elemento único nos três Evangelhos, transliterando as palavras de Jesus em aramaico, o que imprime grande realismo e vivacidade à cena: «Tomando-lhe a mão, disse: «Talitha qûm!», isto é, «Menina, sou Eu que te digo: levanta-te!».

Lucas, por seu lado, fornece-nos muitas informações adicionais, imprimindo um grande colorido à narrativa, que se desenrola frente aos nossos olhos. Logo no início diz-nos que a multidão estava «à sua espera», como que ansiosa por ver Jesus e que a menina era «filha única», o que acentua o carácter dramático da cena. Diz-nos também que a multidão aglomerava-se e apertava Jesus «a ponto de o sufocar». Já no interior da casa, introduz na cena a mãe da criança, que reforça o carácter intimista e familiar da cena, dizendo ainda que Jesus «chamou-a, dizendo em voz alta: Menina, levanta-te!»», como se o próprio leitor estivesse a ouvir Jesus.

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